PELA PORTA DOS FUNDOS

29/05/2011 15:36

 

Queriam-no leão, e ele veio como um cordeiro; queriam-no dominador, e ele veio como servo. Sim, Jesus confundiu o mundo e seus padrões

Por milênios, Deus permaneceu para além das fronteiras do raciocínio conceitual. Segundo Karl Barth, o "Totalmente Outro". Insondável, inescrutável; até surgir Jesus. A humanidade experimentou grande impasse ao se deparar com ele. As suas palavras e obras nos deixaram atarantados.

Kierkegaard disse que Jesus é um paradoxo que a história jamais assimilará. O formidável pensador nórdico acertou na mosca! Até hoje, entendemos muito pouco acerca de Jesus. Fomos atingidos poderosamente por sua mensagem e o impacto da mesma; todavia, passados dois mil anos do seu advento, ainda nos sentimos como que atordoados.

Os judeus da época, que com ele conviveram, tiveram uma dificuldade imensa para entendê-lo. E é óbvio que fracassaram. Afinal, Jesus frustrou suas expectativas e confundiu-os completamente. Aguardavam seu Messias de um jeito, e ele chegou de outro! Esperavam-no pela porta da frente, e eis que ele chega, sutilmente, pela dos fundos. É isso – Jesus entrou na história pela porta dos fundos! Não nasceu como um rei deveria nascer, não viveu como um rei deveria viver. Nem mesmo sua morte foi a de um soberano... E o que dizer dos seus assessores? Certamente, nenhum monarca, em toda a história da humanidade, se fez cercar de um grupo tão despreparado.

Queriam-no leão, e ele veio como um cordeiro; queriam-no dominador, e ele veio como servo. Queriam-no vingador, dando aos opressores a paga que mereciam; mas eis que o Salvador do mundo chegou com um discurso absolutamente insuportável de amor e perdão. Sim, Jesus confundiu o mundo e seus padrões. Dispensou o tapete vermelho, os tapinhas nas costas, desprezou os aplausos; rasgou o protocolo da religião hipócrita e trafegou na contramão dos dogmas da época, sem jamais temer o confronto e o choque inevitável nessa rota de colisão.

Cristo não fez caso algum daquilo que tanto prezamos. Quando os portões da glória terrena se lhe abriram pela mão do tentador, preferiu o anonimato, praticando uma técnica de marketing pessoal que contraria todas as teorias de promoção pessoal hoje tidas como fundamentais, e desferiu golpe mortal na questionável ética da personalidade.

Quem foi esse homem, que diferentemente de todos os homens, viveu a vida mais incrível de que se tem notícia? Definir a pessoa de Jesus é um exercício complexo. O fato é que nenhum dos seus contemporâneos conseguiu fazer uma síntese apropriada acerca dele. No entanto, a despeito de tudo quanto fez e disse, o Mestre foi morto. E se os judeus de sua época – sem querer aqui levantar a bandeira abominável do antissemitismo – mataram-no de forma sumária, os cristãos de hoje não têm deixado por menos! Talvez, façam pior, matando-no aos poucos, de vergonha, de desgosto. É um tanto patético o espetáculo proporcionado pelos seus supostos representantes nos nossos dias. Chega a ser absolutamente ridículo! Houve um tempo em que os apóstolos eram presos e caluniados por causa da cruz e da mensagem; hoje, diferentemente, são levados à justiça por outras infrações que nada têm a ver com a fé que sustentam professar. Posando como enviados do divino, os santos vigários de nosso dias – tanto os católicos, como os protestantes – destoam tão completamente daquele a quem reivindicam representar que causam constrangimento.

Ainda que não consigamos entendê-lo de forma completa, Jesus é o único referencial absolutamente confiável através do qual podemos nos orientar nesse imenso e medonho pântano em que nos metemos. Ele é única garantia de sanidade no meio de um mundo cada dia mais insano. Seguir a Jesus permanece sendo o mais fascinante projeto para uma vida plena de conteúdo e significação. Que todos sejamos discípulos verdadeiros, simplesmente seguindo-o. A ética judaica do Imitatio Dei transferiu-se para nós, cristãos gentios, na forma do Imitatio Christus. Eis o desafio! Você será capaz de aceitá-lo?